Eymard, durante sua trajetória como profissional de saúde e professor sempre existiu uma tônica que é a extensão, poderia nos contar um pouco mais sobre essa área de atuação que existe na faculdade?
A universidade tem três grandes áreas de atuação: ensino, pesquisa e extensão. As que possuem maior prestígio é o ensino, ou seja, os cursos em si e a pesquisa, que é a principal forma de um professor adquirir visibilidade no mundo científico, pois nessa área há muita premiação e os congressos acabam sendo uma forma de propaganda, enfim, o professor vira o “fodão”, tudo pela pesquisa.
A extensão por outro lado, agente brinca, é o irmão pobre, o desprezado da universidade. Nela os alunos e professores se engajam em uma prestação de serviço à comunidade. É um espaço muito flexível porque não segue normas tão rígidas, o que a torna o lugar da invenção na vida universitária.
Na UFPB, descobri minha motivação para ser professor, que foi a extensão, porque, enquanto era professor de “sala de aula”, os alunos cursavam a minha matéria somente por obrigação. Até existiam alguns alunos motivados, mas eram poucos. Já na extensão vai o estudante que quer, melhor vai o que está disposto a pagar o mico, pois, por exemplo, em nosso projeto de extensão, o aluno tem de ir todo sábado, enquanto a maioria dos alunos estão cansados, querendo estudar, e, maioria das vezes, tem de pagar até o ônibus pra ir para a comunidade. Então se seleciona um time de pessoas que estão muito emprenhados com a ideia e, principalmente, que querem sair de faculdade feijão com arroz que mais parece um “coleginho”.
Bom, continuando um pouco mais nas definições, existem muitos tipos de extensão. Aqui temos usado o tipo mais orientado pela educação popular. Hoje olhando para minha trajetória como educador percebo que já tinha trabalhado muito no mundo popular fazendo trabalhos educativos e fico fascinado com o poder de transformação que nós profissionais da saúde temos e, ao longo do tempo, descobri que essa filosofia de conduzir a educação também é muito vantajosa para a relação professor-aluno e hoje sinto orgulho de dizer que sou professor mais pelas experiências que vivi devido à extensão popular que pelas salas de aulas por que passei.
A extensão pode ser também uma forma de permitir o aluno conhecer o mundo da maioria da população, que para muitos é só um espaço para caridade, marcado pela carência e pelo medo, mas quando os alunos chegam lá veem que é um mundo totalmente diferente e fascinante. Ele se torna tão atrativo, como diz uma expressão do Paulo Freire, existe um busca por ser mais, e, ao ter contato com tudo isso nota-se que a criatividade é a verdadeira marca dessa população muito diversa. “Você imagina que é um lugar onde só tem dificuldade e carência, mas quando se chega lá, encontra tanta vitalidade e afetividade que se surpreende”.
O Senhor comentou sobre a chamada Extensão Popular, poderia definir um pouco melhor?
O mais usual dentro da universidade é o pensamento de que temos o conhecimento e vamos, através de um projeto, levar esse conhecimento a uma população carente e ignorante, isso, na ótica de Paulo Freire, é a chamada educação bancária, em que vamos lá “depositar” nossos conhecimentos, e é esse que vai torná-los cidadãos dignos e saudáveis.
Esse tipo de pensamento é o mais comum e reflete um pouco do pensamento dominante dentro da universidade de que somos a aristocracia pensante desse país. Já na ótica da educação popular procura-se ouvir e, diante de um problema, não dar uma resposta pronta, mas faz-se uma roda e discute, isso aprendi quando era estudante, há 36 anos. Quando se passa a ouvir e a procurar soluções coletivas, se descobre que o problema é muito mais complicado do que aparenta e que as pessoas já sabem muita coisa que não se imaginava. Esse é o grande ensinamento da educação popular: todas as pessoas têm uma busca de ser mais e nela geraram conhecimento e criaram estratégias, que nós, que vivemos em uma faixa restrita da sociedade, não conhecemos. Então se estamos dispostos para ajudar, antes de tudo, temos que começar nosso dialogo a partir do que já existe. Gosto muito de uma imagem da educação popular baseada na mochila. Temos uma mochila de conhecimento que é muito valorizada pela população, só que não sabemos quais conhecimentos lhes são úteis, portanto é necessário chegar lá e conversar - “que vocês estão precisando?”. E “puxa” um conhecimento da mochila. - “Será que isso serve?”. - “Ah, doutor, mas isso não tem nada haver conosco”. E assim, ir construindo um conhecimento se se encaixa a realidade deles.
Uma boa definição para educação popular é a construção compartilhada do conhecimento. Quando se faz assim a educação ganha muito mais força e nosso educando , quando ele se sente participando, não fica só um “aprendedor”, pois isso incentiva o protagonismo, a iniciativa e organização próprias.
Outra questão que surge por parte dos alunos que estão iniciando o curso quando falamos de atuação em comunidades é o que estudantes sem nenhuma formação farão nesses locais, pois não possuem conhecimentos?
Essa dúvida realmente acontece muito, principalmente quando o aluno começa em um projeto de extensão. Eu tenho esse projeto de extensão na comunidade Maria de Nazaré em João Pessoa, Paraíba faz 13 anos, se vamos na perspectiva de primeiro ouvir e depois aprender para ajudar, você vai facilmente descobrir como se pode ajudar e, o que se pode fazer, não é algo que se possa ser planejado antecipadamente, só se descobre no processo. É engraçado porque todos os estudantes quando começam estão inseguros, mas depois de uns seis meses todos já estão fascinados com tudo que podem fazer para ajudar aquela população. Talvez em algumas faculdades não se descubra como se pode ajudar porque os estudantes vão para as comunidades cumprir tarefas, não para ouvir. Além disso, eles acabam ficando muito tempo no posto de saúde, que é um lugar muito ruim de conviver com a população, ela não se comporta como realmente é, pois fica constrangida. Por exemplo, que eu fosse chamado pra falar sobre o planalto em um jantar lá, com certeza ficaria constrangido e não iria falar o que realmente penso, mas, sim, o que eles quisessem. Por outro lado se você vai para as casas e cria um vínculo, os véus vão caindo, e você vai descobrindo que pode ajudar mais, não por um conhecimento técnico articulado, mas pela presença, pela escuta e pelo apoio afetivo. Com isso se descobre que nos somos profissionais da saúde não só pelo conhecimento técnico, mas pelos humanos que somos, e esse são capazes de muitas transformações na vida das pessoas. Quando agente se coloca como ser humano, essa educação fica muito mais forte do que quando, por exemplo, me coloco como especialista em educação em saúde.
Retomando um pouco a questão da inserção, no inicio do projeto, queríamos colocar estudantes só mais do final do curso, porque eram os que tinham mais conhecimento, porque já tinhas varias técnicas, entre outras características, contudo apareceram uns estudantes do inicio do curso querendo participar. Ficamos muito na dúvida se eles teriam condições de participar, mas acabamos permitindo que eles entrassem no projeto. Ao longo daquele ano, começamos a perceber que o estudante do inicio do curso contribua mais que os do final, isso nos intrigou muito, e fomos tentar entender o porquê. O estudante do final do curso ele já esta com o olhar formatado, ele só olha para aquilo que está treinado para agir, ele não olha para o todo. Já o do início, o olhar não foi formatado pela tradição médica, então ele se assombra com tudo, se envolve, pois ainda não tem a separação do que é médico e o que não é, e, por isso, acaba tendo um potencial de transformação muito maior que os do final do curso. Agente percebe muito bem que existe uma pedagogia invisível que formata o olhar do estudante e o empobrece. Houve uma professora da UNICAMP que notou muito isso, pois ela era professora no inicio e no final do curso. Um dia houve um acidente muito grave com o rapaz que tomava conta do estacionamento, e isso mobilizou os estudantes. Os do final do curso só queriam saber qual o diagnostico, qual a lesão, que conduta médica foi adotada, já os do inicio queriam saber como estava a família, como ele estava e o que podiam fazer para ajuda. É essa a diferença do olhar, muitas vezes a solução do problema em saúde passa do agir tradicional em saúde, é quando se envolvemos nessas outras dimensões é que se pode transformar mais profundamente.
O senhor comentou varias vezes o choque que há de uma medicina focada na doença pontual e de uma medicina que procura tratar o paciente como um todo. Poderia falar um pouco mais desse assunto?
Acho que hoje vivemos um momento muito rico da medicina, um momento de resgatar algo que é milenar na história médica, esse olhar focado no corpo, de nós médico sermos mecânicos de gente é muito restrito na história. Essa visão praticamente se consolida a menos 150 anos, porque no resto da história da humanidade nos tínhamos uma tradição de olhar para o ser inteiro. Hoje há estudos que resgatam terapeutas da Alexandria, no Egito, mais ou menos contemporâneos a Jesus, que tem escritos de abordagem dos problemas de saúde que abordavam essa dimensão do todo, estamos aprendendo muito com esses escritos dos chamados terapeutas do deserto. De 100 anos para hoje isso foi deixado de lado, porque ficamos muito fascinados com a potência tecnológica da medicina, mas hoje estamos experimentando o limite dessa potência, pois o grosso das patologias são crônico-degenerativas que não tem cura. Elas precisam antes de tudo uma reorientação do modo de viver, só que o médico que só pensa na tecnologia não consegue mobilizar essa mudança no modo de viver dos pacientes, das famílias, ou seja, o próprio movimento da medicina está exigindo uma mudança dessa postura. Hoje, em pleno século XXI, há muitos intelectuais, não só do Brasil; mas do mundo todo, dizendo para se ter um olhar mais amplo. Um exemplo é os EUA que está querendo criar um sistema de saúde parecido com o do Brasil, da Inglaterra e outros países que investem em políticas de prevenção. O grande avanço da medicina hoje não é só tecnológico, mas também de modos de organização e de abordagem, então isso não é uma coisa do SUS, mas sim um movimento mundial. E acho que aqui no Brasil, com a educação popular, com esse jeito mais integrado que sabe trabalhar com os movimentos sociais e valorizar a iniciativa da população, talvez nos estejamos desenvolvendo trabalhos melhores que locais que já tinham tradição mais antiga de atenção primária em saúde, como os da Inglaterra. Tenho convivido com muitos sanitaristas de outros países e eles ficam fascinados com as experiências brasileiras. É algo que hoje o Brasil tem um grande reconhecimento internacional. É na verdade essa abordagem de não transformar com o chicote, em que se tocam os bois para onde é considerado certo, mas uma educação que nos tornamos cumplice do movimento, pois essa população não é uma boiada, ela já tem um caminhar, tem valores e sentidos, quando nos colocamos a disposição desses sentidos nosso trabalho ganha muita potencia
O senhor poderia contar um pouco da sua história com a medicina e como o senhor decidiu que trabalharia com o mundo popular?
Minha história é muito comum, nunca pensei em mexer com trabalho social. Entrei no curso de medicina para ser pesquisador de laboratório, meu guru na época era o professor Pardal da história do pato Donald, achava o máximo porque ele ficava no laboratório e inventava muitas coisas. Fui fazer medicina porque achava que era o lugar de pesquisa com maior apoio financeiro. Quando entrei no curso comecei a fazer estagio no departamento de fisiologia da UFMG, faculdade que estudei, esse era um departamento muito conhecido e valorizado nacionalmente e tinha muitas pesquisas. Frustrei-me muito com a “pesquisa” porque era um processo muito demorado, tinha que repetir muitas vezes a mesma experiência, no final, não era nada parecido ao professor Pardal. Depois disso pensei muitas vezes em largar o curso de medicina, só não larguei porque não tinha outra opção.
Ai, apareceram alguns colegas que começaram a se envolver com movimentos para discutir a reforma no sistema de saúde, isso em 1976 O movimento estudantil organizou um estágio no vale do Jequitinhonha. Na verdade, comecei a me envolver com isso porque era muito ligado à igreja e tinha alguns amigos da igreja que estavam participando, e ai foi indo, acabei encontrando o maior amor da minha vida. Vejo hoje na extensão muitos alunos fazendo a mesma descoberta que eu fiz há 36 anos, ir num projeto de extensão que você não é um colonizador, mas sim um parceiro muda tudo, sua chegada é totalmente diferente, e isso acaba fascinando muita gente. A partir daí, mudei meu foco no curso para me preparar para essa atuação.
Era um tempo de ditadura e, não só eu, mas muitos colegas fizeram isso, de ir para as comunidades pra lutar contra a ditadura. Quando me formei fiz residência de medicina interna, depois disso achei que seria interessante trabalhar no interior e como minha antiga esposa era nordestina acabei vindo para Paraíba. Nessa época não se podia chegar nos lugares, porque você podia ser um agente do governo infiltrado pra descobrir algo sobre alguma conspiração. Como era ligado ao movimento de igreja recebi algumas recomendações, e fui muito bem recebido aqui em vários estados do nordeste. Só que o lugar que mais goste foi aqui na Paraíba na região do brejo, numa cidade chamada Guarabira. Havia uma faculdade que precisava de professores o que acabou sendo a forma que encontrei pra fazer o trabalho “subversivo” no interior da Paraíba. Eles queriam criar uma área de interiorização da faculdade e como tinha qualificação eles me contrataram, justamente pra onde eu queria ir, fique quatro anos em Guarabira, até que fui expulso. Tenho orgulho dessa marca, poucos médicos já foram expulsos de um lugar, pois eu trabalhava com direitos humanos e em época de ditadura isso era totalmente proibido.
Depois de Expulso comecei a escrever um pouco sobre o que havia vivenciado naquela região. Esses escritos acabaram repercutiram muito, porque havia muitos profissionais que queriam fazer esse trabalho comunitário, só que não sabiam como, e não se escreviam sobre isso. Acabei sendo um dos primeiros a escrever sobre esse tema. Foi quando voltei pra minas e me dediquei ao mestrado, nesse momento comecei a escrever para o profissional de saúde, porque até então estava muito voltado para o atendimento em comunidades e após minha expulsão ocorreu essa guinada no foco do meu trabalho, troquei o agir junto à comunidade para agir com outros profissionais da saúde para a formação de estudantes. E ao voltar do mestrado encontre muitos alunos que queriam desenvolver esse tipo de trabalho de extensão, hoje acredito que me tornei um professor essencialmente da extensão.
A espiritualidade no curso de medicina, e no mundo popular sempre foi uma temática muito forte na sua trajetória como professor e escritor. Para o senhor qual é o papel da espiritualidade em um curso como a medicina?
A espiritualidade cresceu no mundo todo no final do século XX, apesar das previsões que diziam que quase todos seriam ateus, isso leva ao questionamento de porque houve esse crescimento? Porque, pelo que vejo, há certo desencanto com essa vida de uma modernidade cientificista que não vê o sutil, o que esta abaixo do nível da água da consciência clara, e certa consciência de que as maiores atrocidades do século XX foram feitas em nome da racionalização da vida: o nazismo, com um discurso de eugenia, na história coloca-se ele como uma excrecência alemã, o que na verdade não era, porque havia todo um movimento intelectual de países como EUA, Inglaterra, França que pregava por bases biológicas a existência de raças superiores, uma dessas correntes era o chamado darwinismo social, outra grande experiência foi o stalinismo, que dizem que 20 milhões de pessoas foram mortas em nome de uma reforma social, e de uma racionalidade apenas racional. Eu me considero socialista, mas acho extremamente perigoso esse marxismo racionalista. Tudo isso gerou um movimento que fizesse renascer a espiritualidade. Essa é uma palavra que gosto muito, porque existem espiritualidades não religiosas. Sinto que quando se vai para as comunidades e vê coisas acontecendo fora do que é racionalmente previsível ou aceitável, tem um impacto muito forte sobre nós. Vejo muitos processos de mudança ocorrendo nesse contato, e isso reorienta a vida, começa-se a valorizar muito o sutil.
Além disso, a espiritualidade tem muita importância na vida da população, muitas vezes servindo como guia. E isso perpassa por temas da educação popular, há um grande teórico da educação popular Vitor Valla, ele foi um pioneiro no tema da espiritualidade na saúde pública, porque quando trabalhamos com o social temos de levar em conta a cultura da comunidade, você chega lá e a as formas de organização tradicionais estão muito esvaziadas, hoje não há mais associações comunitárias, partidos políticos presentes, etc. Para quem viveu há 30 percebe muito essa mudança, só que essa população não está parada, a busca dela, até em organizações social, passa muito pela espiritualidade. Então se viu que para compreender melhor o mundo popular era necessário estudar mais sobre espiritualidade e, como os caminhos espirituais da população normalmente são muito diferentes dos nossos, temos que vencer certos preconceitos.
Podemos dizer que uma das maiores revoluções na espiritualidade do povo brasileiro é o crescimento das igrejas pentecostais, só que nós intelectuais temos muito preconceito em relação a elas, porque, de certa forma, a dimensão emocional é muito forte, o debate racional não é claro como, por exemplo, a teologia de libertação, que é muito fácil de um cientista social trabalhar, por usar muitos elementos da sociologia. Já as pentecostais não e isso acaba sendo visto como somente lavagem cerebral e alienação. Ai o Vala começou a estudar essas igrejas para entender um pouco mais do mundo popular e foi vendo que as pessoas melhoravam muito suas vidas. Ele começou a ver muitos relatos de melhorias na vida de muitos seguidores, que reorganizaram a vida e melhoraram muito. Só que a grande dúvida continua: por onde passa essa melhoria se essas religiões são vistas só como alienantes? Acho que nos trabalhadores que vamos lidar com o mundo social, temos que compreender mais sobre o assunto, porque os pacientes vêm com um discurso que é muito diferente do nosso, por exemplo, se conversarmos com alguém que é do candomblé, se eu não estudo um pouco sobre essa religião, não há como compreender esse paciente, pode ser até que na consulta ele esconda esse lado, mas quando ele estiver em crise, quando a doença o afundar, ele ira buscar motivação para sair dessa crise existencial, trazida pela doença, na vida religiosa, portanto se quisermos ajudar realmente nesse processo temos que saber dialogar com ele nessa linguagem religiosa que é diferente da minha, por isso o estudo sobre as diversas linguagens religiosas, porque a religiosidade é uma marca muito forte na cultura latino americana.
O dialogo nesse ponto em que se fala muito sobre a existência, sobre si e sobre grandes buscas surge a espiritualidade. Então quem quiser fazer um trabalho profundo tem que entender a dimensão espiritual, até mesmo para o processo de cura. Quando um paciente tem uma doença grave é necessária muita garra pra manter o tratamento e no mundo popular brasileiro essa força passa pelo caminho da espiritualidade. Posso até perceber que a religião para minha vida e para minha família é um atraso, mas se quiser ajudara aquele meu paciente que é cristão e está vivendo um momento de crise existencial gerado pela doença, tenho que compreendê-lo em sua linguagem, para poder ajuda-lo mais profundamente. É esse o deslocamento da educação popular que é fundamental. É necessário mergulhar nos saberes do outro e realizar um dialogo nesses valores e não utilizar esse momento para trazê-lo para meus valores, porque quando se respeita isso, o paciente se sente respeitado e se abre profundamente. Na medicina se aprende muitas técnicas de anamnese, elas ajudam a chegar na casquinha, para ser mecânico de gente elas são suficientes, mas se quisermos ser médicos que trabalhe com homens integrais e não fique só consertando “pecinhas”, mas levantar esse homem que esta caído porque vive um processo de câncer, por exemplo, ai surge uma medicina profunda. Sinto que esses médicos mecânicos de gente ganham muito dinheiro porque tem muito aparelhos, mas quando chegam pelos seus cinquenta anos todos já perderam a motivação. Enquanto eles estão ganhando dinheiro para compra uma Mercedes ou para fazer aquela viagem para Europa, ficam muito motivados e trabalham um monte, mas chega um ponto que se cansam e se desiludem com a profissão. Já o profissional que trabalha na perspectiva mais profunda chega aos 60 anos cheio de garra porque é muito fascinante trabalhar com o ser humano. A maioria dos estudantes não sabe da profundidade que essa profissão tem, não é a toa que a população tem uma grande reverencia pelo médico, mesmo depois de toda a sacanagem que os médicos tem feito. Isso porque a população sabe o poder que a medicina tem quando ela é aplicada no seu máximo, quando ela entra no seu campo mais profundo, por isso se associa ela ao sacerdócio, o que nos negamos muito dizendo que somos só profissionais, mas podemos ser muito mais que isso. Essa descoberta a extensão popular ajuda a fazer. Depois que fiz essa mudança na minha vida, pode-se dizer que perdi muito tempo com a extensão durante o meu curso, mas eu fui o estudante que tive a maior nota da faculdade, só não ganhei a medalha porque participei de um movimento grevista que boicotamos uma matéria e acabei ficando com zero. Tinha notas boas porque para mim havia outra motivação, o objetivo não é ter uma boa nota para mostrar para os pais ou para competir, e sim se estuda porque se sente o que é necessário.
Um dos papeis da extensão é justamente o contato com o fazer profissional, você sente o potencial do profissional que se pode ser.
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